Meritocracia: um conceito desvirtuado?

Mauricio Scopel Hoffmann

O sucesso baseado no mérito é um ideal amplamente valorizado. Desde a Revolução Francesa, ideais progressistas têm promovido o valor do que as pessoas são capazes de realizar, em vez de sua posição social. No entanto, em A Cilada da Meritocracia (2019), Daniel Markovits argumenta que o sistema meritocrático está longe de ser justo e, na prática, não favorece o mérito. Ele mostra como a busca incessante por mérito exacerba desigualdades e cria um ciclo de exaustão, no qual tanto os “vencedores” quanto os “perdedores” sofrem. Um exemplo é a educação nos EUA, onde os super-ricos investem cerca de 20 vezes mais na formação de seus filhos do que a média da sociedade, tornando a competição extremamente desigual. Markovits demonstra que, em vez de promover justiça, a meritocracia frequentemente aprisiona as pessoas em um sistema que reforça desigualdades estruturais. Estudos também indicam que pessoas altamente inteligentes e capazes, mas oriundas de famílias pobres, têm, no máximo, as mesmas oportunidades que indivíduos menos capacitados vindos de famílias privilegiadas. Para enfrentar essa disparidade, alguns países adotam ações afirmativas, visando selecionar os mais aptos independentemente das oportunidades herdadas.


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O impacto da herança no futuro econômico

A meritocracia é amplamente exaltada, mas como diferenciá-la do que herdamos “de berço”? Em Herançocracia: É Hora de Falar Sobre o Banco da Mamãe e do Papai (tradução livre de Inheritocracy: It’s Time to Talk About the Bank of Mum and Dad, 2024), Eliza Filby discute como a transferência intergeracional de riqueza molda oportunidades e amplia desigualdades. Ela analisa como o apoio financeiro dos pais – seja para adquirir uma casa ou garantir uma educação de qualidade – oferece vantagens significativas a alguns, distorcendo os princípios meritocráticos. Filby destaca que os Baby Boomers (nascidos entre 1946 e 1964) acumularam capital graças a incentivos e oportunidades sem precedentes. Em contraste, as gerações Millennial (1981-1996) e Z (1997-2012) enfrentaram maiores adversidades econômicas, tornando-se mais dependentes do suporte familiar. A autora defende um debate honesto sobre o impacto desse “banco familiar” e suas implicações para a mobilidade social.


A ilusão do “no meu tempo era melhor” 

A ideia de que “no meu tempo era melhor” é comum, mas será que reflete a realidade? Há séculos, gerações mais velhas têm retratado as mais jovens como moralmente inferiores e incapazes, apontando para um futuro supostamente decadente. Um estudo publicado na revista Nature (The illusion of moral decline, 2023) investigou essa percepção em um experimento inovador. Pesquisadores analisaram dados de mais de 300 mil participantes em 58 países, avaliando visões sobre passado e presente. Os resultados revelaram que as pessoas tendem a idealizar o passado devido a um fenômeno chamado “viés de memória”, que ressalta aspectos positivos enquanto minimiza os negativos. Além disso, mudanças rápidas, como avanços tecnológicos, frequentemente geram nostalgia por tempos que, embora pareçam mais simples, eram menos eficazes em muitos aspectos. O estudo desmistifica essa visão e ressalta a importância de avaliar o presente com maior objetividade. 

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